Apesar de descontextualizada, a frase retrata categoricamente a posição majoritária da cúpula de histriões, denominada Colégio de Dirigentes, que se reunira na última sexta-feira (30) do mês de outubro.
Durante a semana iniciada no dia 18 de outubro, alunos de diversos campi do IFRJ organizaram-se em um movimento autônomo de cobrança a garantia constitucional de acesso universal à educação e ao posicionamento institucional de que o auxílio-conectividade é um fator sine qua non (indispensável) ao início das Atividades Pedagógicas Não-Presenciais (APNPs) no âmbito do ensino médio-técnico. Ressalta-se, que apesar do regulamento da graduação não dispor dos mesmos termos, as condições de acesso devem ser igualitárias, conforme princípios democráticos que regem, até o momento, a sociedade brasileira.
Logo no início da semana corrente (25-31), o movimento estudantil organizado obtivera resultados importantes a suas ações, exemplificado, principalmente, pela reunião com o atual Reitor Rafael Almada e sua equipe de pró-reitores. No encontro intitulado como “Diálogos com o Reitor - Estudantes”, marcado pela extensa fala expositiva da gestão e seguida por discursos cronometrados das representações estudantis, o encaminhamento dos alunos era uno: suspensão do calendário. Frente a isso, o Gestor Máximo afirmou que o levaria para os colegiados e conselhos competentes, conforme defesa dos representantes. Nota-se que, durante a reunião, o termo utilizado pelas representações era “congelamento”, mas, divergindo da posição do Reitor, não há coerência em se cobrar tecnicismo de estudantes, pois estes não são gestores e, portanto, não possuem qualquer obrigação de se apegarem a termos legais.
O primeiro colegiado a se debruçar sobre o encaminhamento estudantil fora o Colégio de Dirigentes, fato este que sugere uma tentativa de concatenação dos gestores acerca do tema. Aos desconhecedores dos espaços institucionais, trata-se de um colegiado com caráter consultivo que possui a finalidade de oferecer apoio ao processo decisório da reitoria, sendo composto majoritariamente pelos Diretores-Gerais, acrescido do Reitor e sua equipe de pró-reitores; sumariamente, uma cúpula de gestores com seus semelhantes. Retornando ao tópico, não há muitas razões que subsidiam a escolha do colegiado nesse momento primário, haja vista que os Conselhos Acadêmicos - sob auxílio da Consulta Pública - foram os principais responsáveis pela construção das APNPs e, portanto, os que teriam mais zelo e propriedade para ponderar inicialmente sobre o tema.
Quanto a reunião em si, além da frase que originara o título do texto, destacam-se alguns outros acontecimentos, popularmente denominados como absurdos. A fala inicial do Reitor é marcada por uma ostensiva relativização do movimento estudantil ao ponto do mesmo dizer que “há vários alunos mandando e-mails que não concordam com o cancelamento” e “os alunos (na reunião) solicitaram que se pensasse sobre o congelamento do calendário”, deste modo, torna-se essencial esclarecer que a solicitação estudantil não foi de “meros pensamentos”, mas de uma concreta suspensão do calendário, esta que tampouco pode ser confundida com cancelamento, tentativa de confusão que demonstra uma clara intenção de desestabilização do movimento.
Em seguida, fora ofertado tempo de discurso para que os Diretores-Gerais, acompanhados de seus Diretores de Ensino, realizassem uma breve contextualização da situação de seu respectivo campus e registrassem seu posicionamento sobre a demanda estudantil. Resumidamente, a grande parte das falas convergem com a ideia de que “a maioria está acessando as aulas, um aluno ou outro está com problema de acompanhamento”, indicando que a conectividade é uma questão pontual (não sistemática) a ser resolvida, e que “os que possuem dificuldades estão dando um jeito para se conectar”, transferindo a responsabilidade de conexão aos alunos e seus responsáveis, incluindo discursos que glorificavam os jeitinhos, como usar o wi-fi do vizinho ou, em meio a pandemia, ir para casa de um amigo para estudar. Mais uma vez, a elite intelectual e, em certa parte, econômica utiliza seu espaço de privilégio para transformar a dificuldade dos mais vulneráveis em discursos de superação, uma romantização das desigualdades sociais.
No entanto, estaria sendo injusto se não destacasse, em um raro momento de lucidez e coerência, a fala de Eudes, Diretor-Geral de Niterói, Diretor-Geral de Niterói Eudes ao enfatizar que “os alunos que estão com acesso, estão com ele desde março. Nossas propostas devem ter em mente os alunos sem acesso”; apesar de importante, contraria o restante da posição do gestor em diversos outros momentos da reunião. Evidencio, inclusive, quando o supracitado Diretor-Geral questiona a representatividade dos líderes estudantis, questionando o processo democrático que deu origem aos posicionamentos, dizendo que não é condizente a totalidade dos alunos, alegando que às vezes um grupo pequeno de alunos toma as decisões e, por fim, defendendo que os Diretores devem entrar em contato com os estudantes, na próxima semana, para reduzir essas divergências. Além de notoriamente deslocada da realidade e de discursar sobre um tópico que não lhe cabe, Eudes alude a uma interferência dos Gestores sobre o movimento organizado e autônomo dos alunos, esquecendo-se que o papel de representação cabe aos representantes democraticamente eleitos pelos seus pares que, no dia a dia, legitimam a posição de seus líderes.
Por fim, salienta-se que os representantes estudantis não esqueceram dos concluintes ao defender a suspensão do calendário; o próprio regulamento das APNPs dispõe de ações especiais para aqueles que estão na reta final de seus cursos, sendo assim, cumpra-se. Ademais, ressalta-se a importância daqueles que foram minorias dentro do colegiado, como o Diretor-Geral Tiago Giannerini do campus São Gonçalo e a Diretora-Geral Celina do campus Duque de Caxias, que defenderam veementemente o posicionamento dos estudantes, em compromisso com os preceitos institucionais e constitucionais, até o final da reunião. Esta que, apesar de possuir 4 horas de duração, não obtivera um encaminhamento sólido, deliberando-se pela “flexibilização do calendário” ao adicionar mais uma semana de acolhimento e empurrando o final do período para frente. Esses dias adicionais, como dito em reunião, serão utilizados para aguardar a entrega do material pela empresa, mapear necessidades pedagógicas e contactar os estudantes. Agora, continuamos nosso movimento autônomo e esperamos a próxima sexta para um novo episódio da cúpula de histriões que afirmam, demagogicamente, terem sido “estudantes como a gente", julgando, de forma pretensiosa, saber o que melhor nos representa.
Escrito por: Paulo Borges Revisado por: Miguel Minucci
Imagem extraída de: portal.ifrj.edu.br
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